sábado, fevereiro 25, 2012

Oscar parte 2: Atuação

Bora falar das categorias de atuação.

>>> Melhor Ator é a categoria mais difícil de apontar uma preferência, porque são cinco trabalhos muito bons. Demian Bichir e George Clooney são os menos favorecidos, já que poderiam ir ainda mais longe se estivessem em filmes mais desafiadores, menos esquemáticos/coxinhas. Dos três que sobram, Gary Oldman é o melhor ator, e nessa atuação especial está magnífico de uma maneira completamente diferente: é uma esfinge, uma entidade, um orixá. Nem sequer vemos os seus olhos. Jean DuJardin dança, sapateia, sorri e dá um show de expressividade, mas acho que Brad Pitt é mesmo o melhor da categoria: carisma a 100%, mas também uma humanização muito delicada desse garoto de ouro que ele interpreta, cheia de sutilezas. Lembra alguns dos melhores momentos do Burt Lancaster já maduro, desconstruindo seu rótulo de leading man bonitão. Excelente mesmo.

Votaria em Pitt. DuJardin vai ganhar.

>>> Pena que Glenn Close não vá ganhar o Oscar, porque, afinal de contas, até que enfim ela realmente merece. É um trabalho muito corajoso de interiorização extrema, num personagem praticamente sem arco, que quer ser invisível, mimetizar-se num corpo de homem. Close não faz concessões para nos aproximar do seu Albert Nobbs: seria uma traição a um tipo tão ensimesmado e, consequentemente, inocente sobre as coisas da vida após essa reclusão voluntária dentro de um traje de mordomo.

Eu gosto de Viola Davis, mas não é exatamente um grande papel, e o que ela injeta na personagem é apenas o básico: nobreza, força, angústia. Não há muita margem pra nuance, mas pelo menos ela é bem boa nesse nível superficial. Rooney Mara tá bem, forte presença física, bom trabalho de composição...

Já de Meryl Streep e Michelle Williams, definitivamente não gosto. Streep é só casca, sotaque, peruca. Uma imitação perfeita, mas não tem muita atuação ali (e ela tem pouca culpa, porque o filme só a manda gritar, discursar e vociferar, e, mais tarde, fazer a rotina de velha). Enfim, é um trabalho todo exterior, uma caricatura traçada em grandes pinceladas, bem aquém do que a própria Streep já fez em outras biografias, enchendo a tela de pathos (ver seu trabalho magistral em Silkwood, por exemplo).

Williams não consegue funcionar nem nesse nível técnico. Sua Marilyn Monroe jamais acontece na tela, a começar pela aparência: a boca é grande demais, a bochecha é grande demais, o corpo é magro demais e ela não tem metade da beleza de MM. Ainda assim, ela funcionaria se fosse capaz de projetar um pouco da graça e da picardia da MM original, mas ela é dura, sem um pingo de humor e mesmo sex appeal. Suas cenas encarnando MM na tela, e não nos bastidores, são todas desastrosas, um atestado de fracasso. Ela jamais seria uma "gelatina sobre molas", como diz Jack Lemmon em Quanto Mais Quente Melhor. Quem nunca viu Monroe na tela de verdade não vai entender por que ela se tornou mito se depender dessa atuação e desse filme.

Votaria em Glenn Close, mas Viola Davis ganha.

>>> O melhor coadjuvante é mesmo Christopher Plummer, cheio de graça, ternura, bom humor, evitando qualquer clichê de "bicha velha" no papel do cara que sai do armário depois dos 70 anos. Max von Sydow nada tem a fazer em Tão Longe e Tão Perto (mas é adorável), Nick Nolte é ótimo, mas sua atuação é puro mais do mesmo de tudo que ele tem feito ultimamente e Jonah Hill... bom, não me pergunte. Nunca vou entender essa indicação. Ela só existe por causa dos filmes anteriores que ele fez, coisas como Superbad. Agora fechou a cara e pronto, Oscar, mas fechar a cara e falar normalmente não é lá nenhum desafio pra nenhum ator. Enfim. Kenneth Branagh tá bem no filme, e dá uma lição em Michelle Williams. Ele também não parece com Laurence Olivier, mas entra em cena e a magia acontece. Temos o Larry irascível, estelar, maior que a vida, com um ou outro detalhe mais profundo - a vaidade, a ambição artística. Não é genial, mas é bem competente.

Enfim, Plummer vai ganhar e teria o meu voto também.

>>> Atrizes coadjuvantes: cinco trabalhos medianos. A melhor delas, Jessica Chastain, tá indicada pelo filme errado - seria A Árvore da Vida em vez de Histórias Cruzadas, onde faz uma bimbo razoável. Octavia Spencer, no mesmo filme, é a velha empregada gorda, negra e engraçada, e ela não supera o template do papel... Janet McTeer está bem em Albert Nobbs, mas também não tem muito o que fazer com seu papel. Melissa McCarthy, em Missão Madrinha de Casamento, apenas comporta-se grosseiramente e não chega aos pés de Rose Byrne, colega de filme que deveria ter sido indicada em seu lugar. Por fim, Berenice Bejo, bem boa em O Artista, mas falta-lhe algum sangue no olho. Ela jamais seria estrela na mesma época que Joan Crawford, Greta Garbo e cia, sorry. Não tem IT, nem faz muita força pra ter.

Votaria em Chastain, mas Spencer vai ganhar.

quarta-feira, fevereiro 22, 2012

Oscar 2012: melhor filme

Bom, o Oscar é esse domingo e vou dar uns pitacos rápidos sobre os indicados a melhor filme, do pior para o melhor (num post seguinte, amanhã ou depois, falo sobre outras categorias).

9 - Histórias Cruzadas

Velho blá blá blá sobre os direitos civis dos negros em mais uma versão sem sangue no olho assinada por brancos condescendentes. Impressionante como continuam engolindo essa redução de complexidades, da patroa vilã de novela mexicana à empregada negra gorda e engraçada à bimbo de bom coração à branca criada pela babá negra. Filme é um horror, um desfile de personagens de papelão em situações tão educativas quanto um episódio de Malhação. O pior, acho, é a ambição do filme: não se trata apenas de registrar uma situação por meio de microcosmo; o cara quer contar logo a história de uma cidade inteira com essa rebeldia baseada na escatologia.


8 - Os Descendentes

Já tive mais paciência com esse tipo de coisa, mas hoje em dia só enxergo um filme sobre perda e luto sem qualquer tipo de dor, devidamente higienizado pelo template de "comédia dramática" do cinema americano independente, especializado em "famílias disfuncionais". Causa-me um pouco de choque aquele corpo em coma, na cama, negligenciado por um roteiro preocupado em inserir piadinhas sobre dieta infantil e carboidratos enquanto uma vida se deteriora. Só me lembro de Julianne Moore berrando na farmácia em Magnólia, perguntando ao farmacêutico se ele já havia visto a morte entrar em sua casa. Payne, com certeza, não viu, ou se viu, não aprendeu nada. Shame on you.

7 - Extremamente Alto e Incrivelmente Perto

Outro filme sobre luto que, apesar de tentar extrair algo de intenso desse sentimento, faz isso da maneira mais obscena com golpes bem abaixo da cintura. O filme não se contenta com a imensa carga emocional do 11 de Setembro: pincela todo tipo de efeito para tentar potencializar essa dor, mas só consegue esvaziá-la e reduzir a tragédia de uma nação a um dramalhão de quinta. Até o amor por NY é fake nas mãos de um diretor inglês, e não chega aos pés até do que Sam Raimi fez em Homem-Aranha 2, por exemplo, pra ficar numa vertente menos independente do cinemão.

6 - Meia Noite em Paris

Woody Allen jogando para a plateia, preguiçoso que só, com mais um daqueles roteiros que precisam de uns dois tratamentos a mais, pelo menos. Filme passa como um megacomício para convertidos: Paris, aversão a intelectuais pedantes, paixão por escritores e artistas que vivem de verdade, problemas de bloqueio criativo. Allen sempre fez mais ou menos o mesmo filme, mas perdeu completamente o frescor quando desaprendeu a organizar suas obsessões em filmes precisos, agudos... Esse é mais um dessa longa fase que ameaça virar definitiva. Nunca mais Maridos e Esposas, Tiros na Broadway, Manhattan ou A Rosa Púrpura do Cairo. Conformem-se.

5 - O Artista

Um festival de gags sensacionais e momentos de pura inteligência visual e cinematográfica num filme meio problemático, perdido numa estrutura rangente de melodrama, cheia de situações pesadas demais pro show de alegria e nostalgia que o filme quer vender. Ainda assim, os pontos altos (o sonho, os aplausos no início, os filmes dentro do filme, a cartela de bang!, o número musical final, etc) são tão altos que a gente perdoa tudo. E pode até se apaixonar de verdade.

4 - O Homem Que Mudou o Jogo

Cinebiografia clínica e gelada sobre estatística e beisebol. Funciona justamente porque o filme trabalha com esse objetivo de precisão enquanto o roteiro corta uma série de dobrados pra ir injetando humanidade num ambiente tão árido. Termina muito bem, ambiguamente, numa vitória ano após ano da incerteza sobre a matemática. Por melhor que seja o objetivo de racionalizar-se, há uma margem imponderável para fazer o homem relativizar o seu caminho, apesar dos avanços. O esporte como metáfora da vida.

3 - Cavalo de Guerra

É quase como que Spielberg tenha feito esse filme no intervalo de Tintin como um pedido de desculpa: no lugar do cinema digital insuportável e barroco com vinte cortes por minuto, uma narrativa clássica, elegante, de visual deslumbrante, inspirada em grandes diretores do passado. Quase ninguém hoje em dia saberia filmar tão bem nessa chave antiquada tanto de cinema quanto de pensamento e emoção. A cena dos dois soldados inimigos unidos para salvar o cavalo deve ser o auge do humanismo spielberguiano.

2 - A Invenção de Hugo Cabret

Um grande triunfo técnico que justifica o 3D como caminho viável de cinema. Mesmo num filme de fantasia, as cenas têm gente de verdade em um set de verdade, e há um trabalho esplêndido de fotografia e direção de arte que ainda ter boa dose de artesanato e olho humano, sem tanta dependência de computadores. O 3D não é protagonista do filme, e sim uma característica de volume das imagens. O melhor é que Scorsese acerta em cheio num cinema do hoje pra celebrar não apenas o cinema, mas a literatura, a crítica, as filmotecas, bibliotecas e a preservação da cultura. Enfim, celebrar a História.

1 - A Árvore da Vida

Vocês sabem o que eu acho desse aqui. É um dos cinco melhores filmes desse século até agora, ou mesmo o melhor, por mais torto que seja. Em resumo, o indicado ao Oscar de melhor filme mais incrível desde os anos 70, provavelmente.